De volta ao tempo: a feira comemorou os cem anos da independência do Brasil

Vista noturna do Pavilhão dos Estados, um dos prédios da exposição do centenário da Independência, em maio de 1923, nos arredores da cidade do Rio de Janeiro. Crédito: Bippus/Biblioteca Nacional

A festa de aniversário dos cem anos do Brasil independente é um mega evento. Realizada na capital Rio de Janeiro, então centro político do país, de 7 de setembro de 1922 a 24 de julho de 1923, a Exposição Universal do Centenário da Independência reuniu 3 milhões de visitantes e outras pessoas que compraram ingressos – o equivalente a 10% da população do país na época – e 10 mil expositores do Brasil e de outros 15 países, adicionando Inglaterra, Estados Unidos, França, Dinamarca, Suécia e Japão.

Uma das maiores já realizadas no país, a feira foi planejada por dois anos através do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio com o objetivo de mostrar a disposição do país de se unir com as nações mais elegantes do mundo e, como elas, dominar a natureza e rever sua economia, cortando a parte da agricultura e expandindo a das indústrias. A industrialização dos sonhos, no entanto, começaria a tomar forma até uma década depois, sob o governo de Getúlio Vargas (1930-1945).

A Exposição Rio, a 29ª Feira Mundial: até 1922, os Estados Unidos já haviam feito oito, França, cinco, e Reino Unido, três. Todos são encorajados através do primeiro, realizado em Londres em 1851, que reúne em combinação 6 milhões seguido por Paris, o primeiro a usar o termo universal, em 1855, com cinco milhões de visitantes. Nesses eventos, cada país mostrou ao mundo o que estava fazendo e planejando. É uma área de inovação: em 1893, por exemplo, a Feira de Chicago, nos Estados Unidos, exibiu as maravilhosas novidades do momento, adicionando chiclete de frutas e a lava-louças.

“A exposição de 1922 substituiu um conceito abalado pela Primeira Guerra Mundial [1914-1918], o do progresso, segundo o qual o global melhoraria, pela modernidade, o que implicava a domesticação da natureza através da tecnologia”, diz a exposição. a historiadora Marly Motta, professora aposentada da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ). “O aço era mais vital que o ouro e a energia elétrica mais vitais do que as cachoeiras, porque a exploração da natureza era mais vital do que a própria natureza. Era a ideia de que essa seria uma forma de o Brasil se integrar aos países mais complexos do mundo, um sonho que vinha desde a época do Império.

No entanto, observa, a festa centenária ocorreu em um clima de tensão política, marcado pelo estado de cerco e censura à imprensa, imposto pelo então presidente Epitácio Pessoa [1864-1942] em reação ao ataque do Forte de Copacabana, em julho de 1922. Um dos momentos mais conturbados da Primeira República (1899-1930), o protesto reuniu funcionários das Forças Armadas e equipes políticas insatisfeitas com o governo federal.

A exposição era composta por edifícios monumentais. A entrada principal, na Avenida Rio Branco, com 33 metros de altura. O espaço nacional, dividido em grandes edifícios, os chamados palácios, e o mínimo, os pavilhões, englobavam 25 seções, abrangendo as atividades do país nas áreas de educação, saúde, comércio, mecânica, indústria química, caça e pesca, florestas, artesanato, estatística, esportes e outros. Cada estado ocupou uma bandeira. Há também um parque de diversões gigante, com festas, música, vídeos e palestras sobre a riqueza de ervas do país.

Ao redor da Plaza del XV de Noviembre, para expor seus produtos e fazer negócios, eles cobriram os 15 pavilhões estrangeiros, construídos em todos os países, com a arquitetura típica de cada um – o do México, por exemplo, fomentado através de construções astecas. Edifícios e ruas foram iluminados ao anoitecer com luz elétrica. “A eletricidade, como a ferrovia, é uma inovação com forte apelo popular”, diz o historiador Carlos de Faria Júnior, da Universidade Federal de Juiz de Fora, Minas Gerais.

No discurso de abertura da exposição, também marcado por desfiles militares, Epitácio Pessoa destacou os avanços da capital federal diante da varíola e da febre amarela. FGV, 1992), Motta lembra que naquela época ainda havia outros problemas de saúde pública, basicamente tuberculose e sífilis, derivados das más condições higiênicas da população.

Para dar lugar a palácios e pavilhões, a preparação da exposição incluiu a demolição do Morro do Castelo, pensada desde o início do século como parte integrante da grande reforma urbana promovida por Francisco Pereira Passos (1836-1913), prefeito do Rio de Janeiro entre 1902 e 1906 (ver Pesquisa Fapesp N° 266). “A exposição é mais uma explicação do motivo pelo qual o Morro do Castelo foi demolido”, diz Faria Júnior. “A exposição representava a modernidade, e o morro representava atraso. procedimento de modernização urbana que eliminou o que se desviou do conceito de progresso.

Local de fundação da cidade, próximo ao Teatro Municipal e outros prédios da Avenida Central, o morro abrigava duas igrejas – São Sebastião do Castelo e Santo Inácio, incorporadas a um hospital infantil – e um observatório astronômico, cercado por cerca de 400 casas e 5. 000 pessoas de recursos limitados. Muito debatido nos jornais, com argumentos a favor e contra, a demolição começa lentamente, com pás e picos de pessoal, e depois avança mais rápido com a contratação de uma empresa americana, que usa jatos d’água. “Os ex-cidadãos foram deportados para os subúrbios”, relata Motta.

Após o término da exposição, a maioria dos prédios foi demolida. Foram 3: o Palácio do Distrito Federal abriga o Museu da Imagem e do Som; o Palácio das Grandes Indústrias ocupado através do Museu Histórico Nacional; e o Pavilhão Francês, uma reprodução do apartamento rural da Rainha Maria Antonieta (1755-1793) na cidade francesa de Versalhes, hoje abriga a Academia Brasileira de Letras.

A exposição levou à estrutura de 3 hotéis majestosos, com vista para o mar: o Sete de Setembro, em frente ao Pão de Açúcar, posteriormente incorporado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Glória, que sediou o programa dos chefes de Estado; e o Copacabana Palace, único ativo, projetado pelo arquiteto francês Joseph Gire (1872-1933), que também construiu a Glória, que fechou em 2013.

Jornalista promoveu programa de elegância sobre protestos musicais afro-brasileiros

“O melhor da decepção carioca vai brilhar no Bloco do Bam-bam-bam”, anunciou o jornal carioca A Noite, em uma reportagem de primeira página de 12 de janeiro de 1923. É um prenúnto da apresentação dos sambistas. , então também chamado malandros, na exposição centenária.

“A apresentação dos sambistas negros revelou uma lacuna para as manifestações culturais afro-brasileiras regionais, bem como um Brasil ligado aos valores europeus”, diz o historiador Walter Pereira, baseado em estudo realizado na Fundação Casa de Rui Barbosa, no Rio. de janeiro, janeiro. O autor do bloco Bam-bam-bam e articulador da apresentação foi um carioca branco, o jornalista político e professor de escola pública Carlos Alberto Nóbrega da Cunha (1897-1974), que combinou suas viagens ao Senado em busca de notícias com visitas à periferia da cidade para a prática de rodas de samba.

Por ser um espaço aberto, o mini-carnaval planejado para a exposição foi adiado duas vezes devido à ameaça de chuva. Por fim, na noite de 4 de fevereiro, domingo, diante de uma plateia acumulada no pavilhão de Festas, Cunha ofereceu o que seria chamado de show de classe. Intercalou explicações didáticas em ocasiões musicais afro-brasileiras com apresentações de 60 sambistas e baianos dos morros Araújo e Pinto, acompanhados por 25 percussionistas com pandeiros, cavaquinhos, reco-recos e pandeiros. Após a apresentação, mulheres negras disfarçadas de baianas distribuíram guloseimas ao público.

“Cunha apresentou à elite do país uma visão menos segregada, parecendo que as manifestações culturais dos outros povos merecem não ser ignoradas na estrutura da nacionalidade. Por mais que os sambistas estivessem no meio da marginalidade, eles não eram marginalidade. Os jornais da época sob pressão para serem trabalhadores justos, não, explica Pereira. Com dinheiro da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro, ele está se candidatando para adaptar seu exame deste episódio, descrito em um artigo. na revista Cantareira em janeiro de 2021, em um documentário milenar, que será apresentado até setembro deste ano.

* Este artigo foi republicado pela Revista Pesquisa Fapesp sob uma licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o artigo original aqui.

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