Arruda enterrado em clima de maravilhosa agitação nesta terça-feira (12)
Mesmo o deleite de quem acompanha a política e as eleições na América Latina há mais de 30 anos não é suficiente para evitar o espanto sentido pelo professor americano Scott Mainwaring ao saber da morte de Marcelo Arruda, membro do PT morto a tiros por um partidário através do presidente Jair Bolsonaro (PL).
“É um fato sério, eu não gosto de nada no Brasil”, disse à BBC News Brasil.
Scott Mainwaring é um dos maiores especialistas mundiais em política, democracias e ditaduras na América Latina. Viveu em países como Argentina e Brasil (onde fez boxe para seu doutorado) e é fluente em português. Nesses países, investigou a redemocratização na região e viu como, em alguns casos, esse procedimento se referia a casos de violência política.
Professor mainwaring na Universidade de Harvard, do qual ele é membro associado. Em 2019, foi nomeado um dos 50 cientistas políticos mais citados em artigos educacionais do mundo. Ele é mais recentemente professor de ciência política na Universidade de Notre Dame.
O americano é um dos dezenas de livros sobre política latino-americana, entre eles: Decadence and Collapse (Sistemas Partidários na América Latina: Institucionalização, Decadência e Colapso), Democracias e Ditaduras na América Latina: Emergência, Sobrevivência e Queda (Democracias e Ditaduras na América Latina). Latina: Ascensão, Sobrevivência e Queda) e Sistemas Partidários na América Latina: Institucionalização.
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crédito, Reuters
Eleições tomam posição em um contexto de polarização política
É com base nessa delícia que ele olha com medo para a escalada da violência na véspera das eleições deste ano no Brasil.
Em entrevista à BBC News Brasil, Mainwaring diz que a morte de Marcelo Arruda é resultado da “relação tóxica” entre violência e política no país.
Segundo ele, o Brasil, assim como os Estados Unidos, vive em um “ódio pessoal e polarização política”.
Para o professor, a polarização no Brasil não desaparecerá e os principais candidatos à presidência da República, Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), devem condenar os atos de violência.
“Você não pode rebaixar a opção para um usuário desequilibrado atacar um usuário para 0. Mas a mensagem dos líderes é muito importante”, disse o professor.
Descubra os trechos da entrevista:
Crédito, Matt Cashore/Harvard
Scott Mainwaring é um dos principais pesquisadores mundiais em política, democracia e ditaduras na América Latina.
BBC News Brasil – Nas últimas semanas, houve incidentes violentos no Brasil relacionados à campanha política. O mais recente, o assassinato de um membro do Partido dos Trabalhadores (PT) perpetrado por um apoiador do presidente Jair Bolsonaro. E isso levanta algum tipo de cautela sobre o que está acontecendo no Brasil?
Scott Mainwaring – Certainement. Il não pode haver lugar para este tipo de violência política. É um ato de direito não incomum e, além disso, é um tipo de ato que afeta a democracia.
BBC News Brasil – Que sinal de morte nesses casos envia para a comunidade estrangeira?
Para mim, isso é um indicativo de uma relação venenosa entre violência e poder político. Como um fato remoto, não acho preocupante. O preocupante é quando você mistura com outros atos de violência.
Crédito, Facebook/Marcelo Arruda
Marcelo Arruda é morto ao comemorar seu aniversário de 50 anos em festa com decorações do PT e fotos de Lula
A equipe da BBC News Brasil lê alguns de seus relatórios
Episódios
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BBC News Brasil – O que quer dizer com isso?
Mainwaring – Estou me referindo a outros atos de violência. Penso no namoro entre políticos e milícias, com o crime organizado, os assassinatos de aspirantes a prefeitos, prefeitos. Quando você mistura tudo isso, então sim, é preocupante.
BBC News Brasil – Dada a história política do Brasil, quão grave é a morte de um ativista político por um adversário?
Mainwaring – Este é um fato sério. Não me lembro de ocasiões semelhantes no Brasil. Isso lembra, por exemplo, as camisas marrons da Alemanha nos anos 1920 e início dos anos 1930. Isso tem um efeito profundo na democracia.
[Nota: “camisas marrons” a chamada através da qual os primeiros membros de uma organização paramilitar nazista fundada por Adolf Hitler em 1921 eram conhecidos. ]
BBC News Brasil – Falou sobre camisas marrons. Na sua opinião, este episódio se assemelha à Alemanha pré-nazista ou à Alemanha nazista?
Mainwaring – Eu não preciso exagerar. Na Alemanha pré-nazista, isso é comum. Os nazistas e comunistas tinham milícias muito gigantes, ainda mais gigantes que o exército alemão na época. Mas está indo nessa direção. Vá nessa direção.
BBC News Brasil – Quais foram os pontos que levaram o Brasil a essa animosidade que levou, por exemplo, à morte desse membro do Partido dos Trabalhadores?
Mainwaring – Desde 2014, o Brasil vem passando por um procedimento muito sério de polarização política. E isso é acentuado pela presença das redes sociais, que exacerbam a polarização política e geram animosidade. Eles transformam essa polarização em um procedimento de animosidade, de ódio. É concebível ter um procedimento de polarização que não se baseia em ódios privados. Mas hoje no Brasil, assim como nos Estados Unidos, há essa combinação venenosa de ódio privado e polarização política.
Crédito, jogue YouTube
Em evento em 2018, Bolsonaro defendeu o tiroteio da “petralhada”
BBC News Brasil – Diante dessa escalada de violência, você acha que o Brasil pode ser palco de algo para a invasão do Capitólio nos Estados Unidos se um candidato não se contentar com o resultado da eleição?
Mainwaring – Isso é um risco.
BBC News Brasil – É de alto, médio ou baixo risco?Como você classificaria?
Não acho que seja grande, mas diria que é mediano. O fato de Bolsonaro denunciar os mecanismos eleitorais do Brasil e dar sintomas de que ele possivelmente não se contentaria com o resultado se perdesse a eleição é uma mentira. Isso, pelo bem da democracia, é muito sério.
BBC News Brasil – O Brasil foi descrito por meio de mavens como um dos países da terceira onda de democratização onde as bases e o funcionamento da democracia estavam indo bem. Esses episódios violentos mais recentes implicam uma deterioração da democracia brasileira?
Mainwaring – Definitivamente. De fato, a democracia brasileira entre 1985 e 2012 ou 2014 teve muitos aspectos muito positivos. A deterioração da democracia brasileira nos últimos cinco ou seis anos é real.
A eleição de um presidente com um perfil tão autoritário quanto Bolsonaro é um sinal em si mesmo.
Quando você elege um presidente intolerante com traços muito autoritários, ele já representa um golpe para a democracia.
Problemas precederam a eleição de Bolsonaro, como corrupção, problemas econômicos, aumento da violência e perda de credibilidade, por um lado, do PT, e, por outro, do status quo para o meio e para a direita.
Crédito, Carla Carniel
Bolsonaro já falou em “atirar” em deputados do PT e “granadinha” para matar Lula e políticos da oposição.
BBC News Brasil – Dado o número de armas que circulam no Brasil, o Sr. está preocupado que o país esteja evoluindo para uma realidade em que atos de violência política são mais frequentes?Há espaço para mais deterioração?
Mainwaring – É imaginável e eu não acho que devemos subestimar o quanto já aconteceu. O exemplo máximo mencionado é o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL). Mas o número de homicídios de aspirantes a prefeitos e vereadores também aumentou. Isso é sério e pode ser acentuado, mas não vejo isso como inevitável.
BBC News Brasil – O ponto de polarização tende a piorar ou até mesmo a eleição?
Mainwaring: Eu acho que vai piorar, porque a cruzada política vai ser entre Lula e Bolsonaro. E 40% do país odeia Lula e 40% odeia Bolsonaro. Provavelmente, a tendência de Lula é não polarizar. Ele polarizará. se se opõe a Bolsonaro, mas não tomará posições radicais. Mas Bolsonaro continua polarizando e, de fato, pintará Lula como o inferno. Acho que é quase inevitável que a polarização se intensifique nos próximos meses. Agora, depois da eleição, é uma era de atenuação imaginável da polarização. Os dois aspirantes terão que forjar alianças para governar o país.
BBC News Brasil – O que é Lula nesse cenário de polarização?
Manchete: Eu Lula pode simplesmente polarizar contra Bolsonaro, mas olhar para o eleitor médio. Lula provavelmente se posicionará para ganhar o centro do Brasil. A probabilidade de ele ganhar aumenta se conseguir capturar o centro do país. Para mim, a estratégia máxima aparente de Lula seria denunciar Bolsonaro, polarizar na frente dele, mas se posicionar como uma opção prática, uma opção viável ou uma opção que no governo não será radical, não vai polarizar.
BBC News Brasil – O presidente Bolsonaro foi acusado por meio de alguns críticos de encorajar seus apoiadores contrários à esquerda. Por outro lado, há alguns dias, o presidente Lula agradeceu a um membro do Partido dos Trabalhadores que atacou um manifestante anti-Lula. Na sua opinião, é justo dizer que Lula e Bolsonaro também são a favor desse clima de tensão que vemos no Brasil?
Mainwaring – Eu teria que estar no Brasil para fazer uma avaliação mais equilibrada dessa questão.
crédito, Reuters
Lula elogiou um ex-assessor do PT que agrediu um empresário em 2018 em um protesto contra o ex-presidente.
BBC News Brasil – O presidente Bolsonaro questionou, ainda que sem apresentar provas, a legitimidade do sistema eleitoral brasileiro. Os militares, muito próximos do presidente, questionaram a integridade do sistema. Você acha que as forças armadas brasileiras vão se contentar com o resultado das eleições?se Bolsonaro perder?
Mainwaring – Se Lula ganhar com uma vantagem moderada, acho que a tendência do exército, neste caso, é se contentar com o resultado. E se a eleição foi muito próxima? Então, digamos, haveria mais área para o exército não se contentar com isso. Eu acho que, em qualquer caso, é improvável que os militares não se contentem com [o resultado]. Mas essa opção aumenta se a escolha estiver incrivelmente próxima.
BBC News Brasil – Você é um dos principais especialistas em democracia, ditaduras e ditaduras militares na América Latina. Na sua opinião, há espaço para uma ruptura democrática no Brasil hoje?
Não acho que haja espaço para o término clássico de um golpe militar. Desde o fim da Guerra Fria, a forma mais comum de ruptura da democracia tem sido através do que chamamos de “apreensão do poder pelo executivo”. seria, digamos, quando o presidente, ao longo do tempo, degrada a democracia a ponto de deixar de ser um regime democrático. Outro exemplo transparente é a Nicarágua e o regime de Daniel Ortega. Mas pode-se pegar um caso como a Hungria de Viktor Orbán. Acho que essa ameaça é real, especialmente se Bolsonaro ganhar novamente. A ameaça de que ele tentará concentrar mais poder. . . seus ataques ao STF são um indicador de preocupação. Agora, não se espera que Bolsonaro tenha maioria no Congresso e isso complica as coisas para ele.
BBC News Brasil – Nos últimos anos, houve um remanescente de regulamentações no Brasil relacionadas à aquisição de armas e alguns especialistas agora dizem que o Brasil tem mais armas em circulação do que no passado. Diante de todo esse ambiente tenso de nossas escolhas, como se preocupar é ter uma escolha nesse ambiente?
Não sei como isso é preocupante para a eleição. Acho que (assassinatos como o do Marcelo) são um episódio raro e não acontecem com muita frequência. O mais importante é se preocupar com o acúmulo de armas de fogo. é a prática cotidiana da democracia em bairros carentes do Brasil, como as favelas do Rio de Janeiro. É aquele que é exercido através de milícias e organizações nesses espaços e na região amazônica. Eu diria que a democracia brasileira sofre muito e isso não é novo.
BBC News Brasil – Você acha que há mais medo este ano, ao ar livre no Brasil, em comparação com as eleições deste ano em comparação com outros anos?
O temor não é que a fórmula eleitoral seja frágil, mas que um dos candidatos, Bolsonaro, não se contente com o resultado.
BBC News Brasil – Na sua opinião, há algum sinal de que essa tensão que existe pode estar esgotada após as eleições?Ou esse ponto de polarização é algo que está aqui para ficar e vai levar algum tempo para desaparecer, se é que é mesmo?
Mainwaring – Se Lula ganhar, vai depender de como ele passa. A polarização não se dissipará. Não tem como ele desaparecer, mas pode diminuir. E como? Se o governo Lula conseguir, a tendência é cortar a polarização. Por outro lado, se adotar posições mais moderadas, diminuiria a polarização. Por outro lado, se os casos de corrupção se repetirem, se a economia não voltar a uma trajetória mais positiva, se a violência não diminuir, é improvável que a polarização diminua.
BBC News Brasil – M. a discutiu que a morte de Marcelo Arruda é outro indicador de uma relação venenosa entre violência e poder político. O que exatamente os atores políticos podem fazer para evitar que tais episódios aconteçam?
Mainwaring – Para os candidatos Bolsonaro e Lula, basicamente porque eles são os únicos com uma possibilidade viável, eles terão que denunciar essa violência. Isso é muito importante. Você não pode diminuir a opção de uma pessoa desequilibrada atacando outra pessoa para 0. Mas a mensagem dos líderes é muito importante. O uso da violência terá que ser renunciado.
BBC News Brasil – Em uma matriz, o presidente Bolsonaro disse: “Você viu o que aconteceu ontem?Uma briga entre outros dois caras lá em Foz do Iguaçu?Bolsonaro, não sei o que é. Ela é a usuária que o esfaqueou em 2018 e que era filiado ao PSOL. Em suas redes sociais ele não se arrependeu da morte de Marcelo e acusou a esquerda de violência. Esse tipo de assistência tranquiliza os outros?
Mainwaring – Claro que não. Agora, eu não estava ciente do incidente em que Lula aplaudiu a agressão de um PT contrário a Bolsonaro. E isso, também, na minha opinião, é lamentável. Ambos terão que denunciar o uso da violência.
– Este texto foi originalmente publicado em https://www. bbc. com/portuguese/brasil-62144553
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