Água, uma piora no mundo

Termina neste domingo a 29ª Semana Interamericada e a 22ª Semana Nacional das Águas do Rio Grande do Sul. No entanto, apesar dos esforços dos governos ao redor do mundo, o desafio da água está piorando e, segundo especialistas, já está se configurando como uma crise hídrica.

A emergência climática de ano para ano está mais presente. Tempestades, furacões, inundações e secas causam danos severos e rápidos. Mas, entre esses fenômenos, a crise hídrica não é tão repentina: piora com o tempo. Reservas no mundo, falar sobre uma crise neste setor possivelmente pareceria sem sentido, até mesmo absurdo. Para se ter uma ideia, dois terços do que flui para o Rio Amazonas também podem atender à demanda mundial por água. No entanto, grande parte do país enfrenta dificuldades de origem e problemas de colheita causados pela seca.

Segundo artigo de opinião publicado na revista clínica Nature, entre março e maio de 2021, por exemplo, o clima seco na região centro-sul do Brasil causou a escassez de 267 quilômetros cúbicos de água retida em rios, lagos, solos e aquíferos , em relação à média sazonal dos últimos 20 anos. Como resultado, muitos reservatórios vitais atingiram menos de 20% da capacidade, e a agricultura e a produção de energia sofreram. Segundo os 3 pesquisadores que assinaram o artigo, Augusto Getirana (Science Applications International Corporation, EUA), Renata Libonati (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e Marcio Cataldi (Universidade Federal Fluminense), de julho a dezembro de 2021, quando foi publicado o texto, os custos do café aumentaram até 30%, os custos da soja aumentaram até 67% de junho de 2020 a maio de 2021 e as despesas com eletricidade aumentaram até 130%. Além disso, muitas cidades enfrentam um racionamento de água muito próximo. Os autores dizem que há décadas tem havido “uma falha do governo em reconhecer a seca como uma questão de segurança nacional e externa”. “A crise hídrica no Brasil é uma crise global. O que é necessário é um plano nacional coordenado de mitigação da seca desenvolvido por pesquisadores, formuladores de políticas, indústria, setor público e sociedade civil.

“Essa crença de que temos água em abundância, tem limites, esconde um pouco da realidade”, acrescenta o professor Guilherme Marques, coordenador do Centro de Pesquisa em Planejamento e Gestão de Recursos Hídricos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. (UFRG). “Na verdade, temos muita água onde há poucas pessoas e muitas outras pessoas onde há pouca água, e onde a água é muito poluída. Somos um país rico em água globalmente, mas quando você olha região por região, o cenário não é tão confortável”, observa. O pesquisador une os conceitos de seus colegas clínicos dando alguma outra explicação para a crise. “Isso se refere à má gestão. Por exemplo, há espaços onde há água, mas a água está contaminada porque não é bem controlada. Não investimos em saneamento, deixamos poluir, deixamos mais água ser retirada do rio do que há”, alerta.

A Semana Nacional da Água é promovida por meio da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – Seção RS (Abes-RS). O objetivo do evento, que inclui atividades técnicas, culturais, artísticas e sociais, é celebrar a importância da água. Empresas, secretarias estaduais e municipais de saúde, meio ambiente e educação, indústrias, comitês de bacias, associações de redes, clubes, entre outras entidades, promovem atividades de usuário ou online, com o objetivo de alcançar o maior público imaginável.

O mundo inteiro sofre de problemas de escassez de água. De acordo com o Fundo Internacional de Emergência da Criança (UNICEF), outros quatro bilhões de pessoas, ou dois terços da população mundial, vivem com severa escassez de água há pelo menos um mês por ano. Mais de 2 bilhões de pessoas vivem em locais com suprimentos de água insuficientes. A organização estima que até 700 milhões de pessoas poderão ser deslocadas até 2030 devido à escassez excessiva de água.

Na Califórnia, na costa oeste dos Estados Unidos, a crise hídrica é um tema recorrente. A região enfrenta secas comuns e passou por uma das piores de sua história nos últimos 3 anos. Na semana passada, o governo local disse que estava se preparando para outro ano seco. Mesmo chuvas recordes em outubro do ano passado não foram suficientes para mitigar o cenário. ainda mais trágico. Em Djibuti, Quênia, Somália e Etiópia, a crise hídrica está colocando em risco a vida de mais de 20 milhões de pessoas. As famílias são forçadas a deixar suas casas em busca de comida e água, ameaçando sua saúde, educação e segurança. Na Somália, há outros 3,7 milhões de pessoas em campos de emergência, muitos dos quais estão buscando água depois de desperdiçar seus camelos e vacas até a morte de sede.

No Brasil, o cenário também é preocupante. No ano passado, partes do país sofreram secas entre 2% dos períodos mais secos da história observados para a estação, segundo o Monitor de Secas da Agência Nacional de Águas (ANA). O mapa mais recente disponível pelo sistema, a partir de agosto de 2022, continua mostrando secas excepcionais em partes de São Paulo e Minas Gerais, além de secas excessivas nos mesmos estados e em Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Goiás.

Em meados de 2021, houve alertas sobre os baixos níveis de água na Bacia do Paraná. Sistemas com baixos saldos hídricos, combinados com baixo investimento em infraestrutura e períodos de baixa precipitação, podem levar a crises. No caso da Bacia do Paraná, isso possivelmente significa restrições de fonte de energia nos subsistemas Sul e Sudeste/Centro-Oeste. Segundo artigo de Guilherme Marques, em coautoria com a pesquisadora Ana Paula Dalcin (Ufrgs), há uma forte ligação entre água, energia e alimentos no Brasil. e, portanto, as consequências de uma seca são sentidas em vários setores. “Usamos água para produzir energia, usamos água para produzir alimentos e, ao mesmo tempo, também queremos energia para produzir alimentos e produzir água. A produção, o tratamento, o bombeamento e a distribuição da água consomem energia”, explica o professor.

De acordo com o balanço de 2019, 64,9% da matriz elétrica brasileira vem de usinas hidrelétricas. A produção dessas usinas depende da operação dos reservatórios do Sistema Interligado Nacional (SIN), no qual os volumes de água são tratados. como uma garagem de força. A fazenda terá que procurar controlar a produção e transmissão de força em busca do menor custo imaginável. Assim, logicamente, ter água armazenada é vital para manter o equilíbrio da produção e reduzir custos. A garagem baixa afeta todos os usos da água. Para evitar que os reservatórios atinjam graus críticos e a geração hidrelétrica seja paralisada, a vazão liberada é menor. “É como fazer uma longa caminhada e há apenas uma pequena garrafa de água. Você ainda tem alguns minutos para chegar lá, você vai salvar isso. Água, você não vai mais beber como bebeu no início. Mas quando fizermos isso, todos os usos serão impactados”, compara Marques.

Mais de um ano depois, após os principais efeitos conjunturais da seca de 2021, a bacia do Paraná ainda não se recuperou. A quantidade de água liberada permanece abaixo dos pontos pré-crise, impactando o ecossistema no longo prazo. O ecossistema quer água, eu tenho que dar água para que me dê água branca. A tomada de água funciona com bombas e, se o ponto de água estiver abaixo da bomba, não funciona”, explica o pesquisador da Ufrgs. Nesses casos, o uso da água terá que ser priorizado, não permitindo todos os usos, como cultivo irrigação “Temos esse efeito dominó”, resume.

A agricultura é uma das primeiras a ser afetada pelo baixo armazenamento de água. “Hoje temos uma agricultura irrigada muito gigantesca no país. Às vezes a gente tem esse conceito de que o Brasil tem um solo muito fértil, que chove muito. De fato, não é. Somos muito dependentes da água, digamos ‘não natural’, que naquela época não existiria para nossas plantações”, acrescenta Cataldi, coautor do artigo publicado na Nature. A irrigação é feita com água de rios e aquíferos. “E também temos um componente gigante de água que é usado para hidratação dos animais em criações”, lembra. Dito isso, os autores defendem que a água deve ser considerada um bem nacional, já que o produto interno bruto do Brasil depende da agricultura. “Se considerarmos, por exemplo, o sul do país, do centro do Paraná para baixo, o clima apresenta uma variabilidade maravilhosa. A chuva é distribuída em todas as estações do ano, mas há janelas de falta de chuva, que podem ocorrer em qualquer época do ano”, explica Ana Maria Heuminski de Ávila, professora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). ajustar esses períodos, alongando-os. “Esta é uma imagem que vem surgindo nas últimas décadas, principalmente a partir dos anos 2000, e que reflete o que mais podemos esperar em termos de atualização climática”, alerta. .

Em 2007, com a publicação do quarto relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), os ajustes climáticos globais em curso e suas consequências para a agricultura foram amplamente divulgados. “Foi um arco muito grande em termos de conscientização, mas ainda hoje, e naquela época, há alguma resistência às mudanças climáticas. Você percebe que, embora seja mostrado com o KnowledgeArray, há resistência da população, que são os negadores do Holocausto”, lamenta a pesquisadora. No início deste ano, as chuvas mataram mais de 150 pessoas em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Em julho, as chuvas também causaram mortes no Nordeste e deslocaram milhares de pessoas. Municípios do Rio Grande do Norte chegaram a declarar estado de calamidade pública. “Está cientificamente comprovado que essas ocasiões se intensificaram com as mudanças climáticas. Um desafio persistente também é o La Niña, que já está surtindo efeito na redução das chuvas no sul do país. As últimas duas ou três safras já foram bastante afetadas pela falta de chuvas”, reflete Ana. “Os cenários futuros implicam que é a configuração de longo prazo, ou seja, o acúmulo nessas secas prolongadas, que esse cenário se repete com essa frequência ou até acentuar um pouco mais nas próximas décadas”, alerta.

O estado mais ao sul do Brasil tem um regime de chuvas muito diferente dos vizinhos Paraná e Santa Catarina. “O Rio Grande do Sul está sujeito a uma série de fenômenos muito complexos. O RS ficou 42 dias sem chuva e de repente, quando as chuvas chegam, você vê tempestades muito fortes”, diz Cataldi, também professor da Universidade Federal Fluminense (UFF). Para o pesquisador, o Estado está em situação de vulnerabilidade. “Esse é o pior cenário que podemos ter. há muito tempo sem chuva, debaixo do tanque, é difícil consumir água. O solo em si passa pelo processo interno, tornando-se mais impermeável”, diz. Quando o solo se torna muito seco, comparável a um deserto, torna-se imune a tempestades. “A má distribuição da intensidade das chuvas é o que mais me preocupa. É um dos estados que, para aqueles que examinam o clima do Brasil, estamos mais preocupados”, alerta Cataldi.

“O que falta para nós é melhorar a capacidade de controle em nível estadual”, diz Marques com firmeza. Segundo o professor da Ufrgs, os órgãos responsáveis ​​por esse controle às vezes pintam com poucos recursos humanos. “Normalmente há poucas pessoas. Essas organizações estão muito mal equipadas para processar uma enorme quantidade de informações. Se você não pode monitorar, não sabe a que água tem direito, como vai administrar um recurso que não conhece?”, questiona. “O RS melhorou muito desde 2014, houve um salto de qualidade, começaram a contratar mais pessoas, uma melhora muito significativa”, elogia Marques, ainda há um longo caminho a percorrer no controle de pool. no Rio Grande do Sul. “Em geral, no Brasil temos algum outro gargalo nos comitês de bacia, que são órgãos com representantes do poder público, usuários etc”, comenta. as bacias e propondo planos de ação, chamados planos de ação. Não existe uma estrutura comprometida para prestar essa assistência técnica, que são as Agências de Águas “, previstas em lei. Essas agências não foram criadas em nenhum lugar do Brasil”, relata. No Rio Grande do Sul, vários comitês nem concluíram sua planos de bacia, o que, para o professor, é “muito grave”. “Como é que eles não têm a maior ferramenta de controle, que é o plano? Alguns nem começaram. É porque hoje falta essa ajuda técnica.

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Infraestrutura (SEMA) afirma que “tem fortalecido os movimentos de fortalecimento de seu corpo técnico e tem trabalhado no desenvolvimento de políticas públicas coerentes para enfrentar a seca, por meio da Diretoria de Gestão de Recursos Hídricos e Saneamento”, que conta com a representação da sociedade civil nos Comitês da Bacia. Uma organização de analistas da SEMA e da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr) “está frequentemente tropeçando no fator seca, acrescentando que realizará uma consulta educativa em outubro, em parceria com o Consulado Geral dos EUA em Porto Alegre, intitulado Cooperação dos EUA. EUA-RS para mitigação da seca. “A Sema pretende apresentar, nos próximos meses, um plano fisicamente poderoso para combater a seca, que “é um componente decisivo da atividade agrícola, fundamental para a economia do sr”, disseram, em nota.

A segurança hídrica existe quando há água suficiente e de qualidade para atender às necessidades humanas, atividades econômicas e conservação de ecossistemas aquáticos, acompanhada de um ponto apropriado de ameaça de secas e inundações.

Segundo relatório de 2021 da Agência Nacional de Águas (ANA), entre 2014 e 2017 e em 2020 houve um alívio significativo nos fluxos em grande parte do Brasil. “A região nordeste, que depende muito da água armazenada em seus reservatórios, passou por uma seca severa, que durou de 2012 a 2016. Refletindo a seca de cinco anos consecutivos, 65 reservatórios que obtêm água para fontes públicas secaram em dezembro de 2016. “, diz o documento. Os registros pluviométricos também mostraram valores abaixo da média. Na última década, em várias regiões do Brasil, foi possível observar situações críticas de seca que só eram esperadas, em média, a cada 50 anos. Os episódios de seca foram mais acentuados do que os eventos de precipitação, demonstrando que outros pontos além do clima, como uso da terra, água e uso da terra, têm um efeito na disponibilidade de água. “Ainda não foi suficiente ver evidências significativas de situações de disponibilidade de água”, escreveram os especialistas.

Na publicação da revista Nature, endossada por mais de 90 pesquisadores, os cientistas propõem 4 eixos de ação para aliviar a crise hídrica. A primeira é a otimização do uso da água. O artigo observa que apenas 13% do solo cultivado no Brasil é irrigado e aponta que os aquíferos são subutilizados em solo brasileiro. , esse uso terá que ser feito de forma sustentável, para evitar o esgotamento das fontes. Para isso, voltamos ao fator de gestão da água: é necessário um monitoramento inteligente dos recursos hídricos.

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), em e-book publicado em comemoração aos 60 anos, reúne as pinturas de diversos cientistas e destaca os benefícios de seguir essa estratégia. um esforço primário para monitorar os recursos hídricos, seja superficial ou subterrâneo, seria pago sem problemas com o ganho de receita, empregos e taxas fiscais que a agricultura irrigada proporcionaria. “Isso também se aplica a um maior controle dos recursos já em uso hoje. , uma necessidade para que não sejam observadas consequências mais graves nos anos seguintes. Os autores propõem que o Estado seja culpado de um plano de seca, escassez de água um problema de segurança nacional e estrangeira. Monitorar a disponibilidade de águas subterrâneas é fundamental. De acordo com o artigo, o Brasil monitora as águas subterrâneas em 409 localidades em todo o país, enquanto as pinturas em rede da Índia têm mais de 22. 000 pontos de rastreamento.

Outro ponto destacado no artigo da Natureza é a consulta da diversificação das fontes de força. Pesquisadores praticam que, quando não há água suficiente para produzir eletricidade, o país recorre à combustão de combustíveis fósseis, por meio de usinas termelétricas mais caras e poluentes. “[A diversificação das fontes de força] é obrigatória, queremos avançar mais nesse aspecto”, concorda Marques. Teremos que pensar em respostas para a garagem da força do vento e do sol. “São energias intermitentes. Quando há sol, gera, quando não há, não gera. Mas a chamada na rede varia. Portanto, é obrigatório poder comprar essa força. Hoje, temos essencialmente duas táticas de armazenamento de força: uma é combustível, seja nuclear, gás, carvão, petróleo, e o tempo é água, a barragem Ainda não temos nenhuma outra geração de garagem, então, à medida que instalamos mais renováveis, também quero pensar em como vamos comprá-los para atender às necessidades de diversificação. “

Finalmente, os cientistas garantem o fim do desmatamento na Amazônia. Segundo especialistas, o desmatamento é um fator contribuinte para a crise hídrica no Brasil e no mundo. Isso se deve a um fenômeno chamado “rios voadores”, no qual a umidade da transpiração de árvores amazônicas é transportada através de nuvens para outros lugares. “Teremos que enfatizar a importância da água para o Brasil, para a vida. E por quanto tempo acreditamos que a água era um recurso infinito?A água talvez seja nosso bem mais valioso, o único a quem queremos prestar mais atenção”, conclui Cataldi.

*Com a colaboração de Veridiana Dalla Vecchia

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