A Pesquisa Nacional sobre Aborto (PAN) de 2021 mostra que uma em cada sete mulheres, com mais de 40 anos, já realizou pelo menos um aborto no Brasil. A pesquisa realizada em novembro de 2021 entrevistou duas mil mulheres em 125 municípios.
O estudo foi coordenado pela antropóloga e professora da Universidade de Brasília, Débora Diniz; através do professor visitante da Universidade de Columbia, Marcelo Medeiros; e através do professor da Universidade Estadual do Piauí Alberto Madeiro.
Panorama
A pesquisa indica que mais de uma proporção (52%) de todas as mulheres que fizeram abortos tinham 19 anos ou mais quando fizeram um aborto pela primeira vez. Desse contingente (menores de 19 anos), 46% eram adolescentes entre 16 e 19 anos. com idade de 6% eram mulheres entre 12 e 14 anos. De acordo com a lei, praticar atos sexuais ou obscenos com uma criança menor de 14 anos é crime de estupro de pessoa vulnerável, consentido ou não, sob pena de prisão de 8 a 15 anos.
Nesta edição, a taxa de aborto apresentou um mínimo em relação aos dois PANs anteriores, realizados em 2010 e 2016. Em 2021, cerca de 10% das mulheres entrevistadas disseram que tiveram pelo menos um aborto na vida, acima dos 13% em 2016 e 15% em 2010. Os estudos concluíram que a diminuição pode ser explicada pela tendência crescente para o uso de estratégias contraceptivas reversíveis na América Latina e no Caribe.
Em 2021, 21% das mulheres que abortaram foram submetidas a um procedimento momentâneo, chamado de aborto repetido. Entre elas, as mais comuns são as mulheres negras.
Algumas das entrevistadas (39%) estavam usando medicação para interromper a gravidez. Pesquisas mencionam que o medicamento mais utilizado é indicado para a prevenção e remédio da úlcera gástrica. Além disso, 43% das mulheres foram hospitalizadas por aborto completo.
“Nessas situações, temos relatos traumáticos de perseguição, intimações policiais, mulheres algemadas em hospitais. Portanto, há um efeito sobre a saúde pública por causa da ocupação de leitos, sobre a saúde das mulheres porque, por algum motivo, elas usaram drogas indevidamente ou foram para a clandestinidade em clínicas prejudiciais, ou porque não têm dados sobre como é um aborto. É por isso que eles estão caçando hospitais”, disse a antropóloga e uma das autoras do estudo, Debora Diniz.
A pesquisa também indicou que as gestações acidentais não foram incomuns entre as mulheres no Brasil. Duas em cada 3 gestantes (66%) tinham planejado a gravidez. Débora Diniz propõe a educação sexual como componente da solução “para que esse último recurso, o aborto, seja usado”.
Perfil
A pesquisa mostrou que o perfil das mulheres que abortaram é o de outras pesquisas: são de todas as idades do ciclo reprodutivo, religiões, educação, raças, classes sociais, prestígio conjugal e regiões do país.
No entanto, a pesquisadora Débora Diniz afirma que “apesar de serem mulheres, que estão em todos os lugares, há uma concentração maior no grupo de máxima vulnerabilidade. São negros, indígenas, vivendo no Norte e Nordeste, menos informados e muito jovens. “
Os dois mil respondentes da PNA 2021 foram escolhidos aleatoriamente entre mulheres alfabetizadas, com idades entre 18 e 39 anos e residentes em áreas urbanas. O método de pesquisa utiliza um questionário presencial com questões sociodemográficas, como idade, religião e renda. .
Outro questionário com perguntas sobre o aborto preenche-o ela mesma e coloca-o em uma urna selada. Os coordenadores de pesquisa percebem que a estratégia de coleta de dados sensíveis reduz a taxa de respostas falsas, pois preserva o anonimato dos entrevistados.
Aborto legal
No Brasil, o aborto é legalizado em 3 circunstâncias: gravidez por estupro, se representar ameaça de morte materna, e em casos de anencefalia fetal (falta de formação cerebral fetal).
Na prática, no entanto, a situação tem sido diferente. A ministra da Mulher, Cida Gonçalves, disse à Agência Brasil “que as mulheres e as mulheres têm encontrado obstáculos no aborto, em condições já previstas em lei”. Para ela, o resultado é que “quando o direito ao aborto é negado, por exemplo, a uma vítima de estupro, as evidências indicam que essa mulher o fará de forma nociva e clandestina”.
De acordo com a avaliação da ministra, o executivo deve garantir que todas as mulheres e mulheres tenham seus direitos garantidos e “que tenham acesso a dados sobre esses direitos e como acessá-los”.
O Ministério da Mulher lembra que em 2013 foi sancionada a lei do minuto seguinte para permitir o atendimento integral e multidisciplinar às vítimas de estupro nas instalações do Sistema Único de Saúde (SUS). “Esse serviço é fundamental para a prevenção da gravidez e infecções sexualmente transmissíveis, entre outros cuidados de saúde física e psicossocial”, disse a ministra Cida Gonçalves.
Todos os hospitais aprovados pelo SUS, que oferecem serviços de ginecologia e obstetrícia, devem realizar abortos nas instâncias previstas em lei. No entanto, de acordo com o site Mapa do Aborto Legal, apenas 42 hospitais realizaram o procedimento em setembro de 2022.
Em nota oficial enviada à Agência Brasil, o Ministério da Saúde afirma que “está comprometido com a política de atenção integral à saúde da mulher, com vistas à inclusão e discussão no contexto da saúde sexual e reprodutiva; e também a Rede Cegonha, que inclui o atendimento às mulheres em situação de aborto”.
A partir de agora
Em janeiro deste ano, o governo federal derrubou uma ordem do Ministério da Saúde que exigia que os médicos comunicassem à polícia a justificativa para interromper a gravidez, mesmo nos casos previstos em lei, e também retivessem as provas de estupro.
No mesmo mês, a brasileira se retirou da Declaração do Consenso de Genebra sobre a Saúde da Mulher e o Fortalecimento da Família, assinada em 2020, por entender que ela representava uma posição das nações contra o aborto.
Para Débora Diniz, a investigação da ação que descriminaliza o aborto nas primeiras doze semanas de gestação, perante o Tribunal Federal (STF), é urgente.
“Em uma democracia, os poderes Legislativo e Judiciário têm legitimidade equivalente à violação de um direito básico, como a aptidão e o fator aborto”, disse ele. “Trata-se de não parar. Trata-se de tratar e prevenir. É sobre a vida, sobre a dignidade, especialmente dos jovens vulneráveis neste país”, explica o pesquisador.