Por Léo Rodrigues – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro
Há dois dias, o Porto de Manaus anunciou que o Rio Negro havia atingido um novo mínimo histórico. Sua altitude ficou abaixo de treze metros pela primeira vez desde 1902, quando as medições começaram. As fotografias são impressionantes: as áreas cobertas pelo leito do rio agora são cobertas por bancos de areia.
A seca prolongada na Amazônia está deixando muitas comunidades vulneráveis. De acordo com boletim do governo estadual publicado neste domingo (22), 59 dos 62 municípios do Amazonas estão em situação de emergência e 158 mil famílias foram afetadas.
A situação coincide com a intensificação do fenômeno El Niño, caracterizado pelo enfraquecimento dos ventos industriais (que sopram de leste para oeste) e aquecimento das águas superficiais na componente leste da região equatorial do Oceano Pacífico. A interação entre a superfície do oceano e o meio ambiente ocorre em períodos de tempo que variam de 3 a sete anos e tem consequências para o tempo e o clima em outras partes do planeta. De fato, a dinâmica das massas de ar no Oceano Pacífico adota novos modelos de transporte de umidade, afetando a distribuição de temperatura e precipitação.
Para o geógrafo Marcos Freitas, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o El Niño sozinho não muda o cenário do Rio Negro. Para ele, está claro que a seca na Amazônia está relacionada ao aquecimento global. , as chuvas na região do Rio Negro são formadas basicamente pelo movimento de massas de ar que não vêm do Oceano Pacífico, mas do Atlântico.
Especialista em recursos hídricos, Marcos Freitas é coordenador executivo do Instituto Virtual Internacional para Mudanças Globais (Ivig) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Altos Estudos e Pesquisas de Engenharia (Coppe), ligado à UFRJ. Desde 2008, também é membro do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), organização criada em 1988 no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU).
Em 2010, quando o Rio Negro enfrentava outra seca severa, o pesquisador coordenou um estudo para avaliar a situação. Naquela época, o rio registrava um ponto de treze ,36 metros, o ponto mais baixo de sua história até que a seca do ano passado fosse superada. Com base na experiência de alguém que analisou o cenário em profundidade há treze anos, Marcos Freitas conversou com a Agência Brasil e avaliou o cenário existente.
Agência Brasil – O avanço do El Niño pode explicar a seca do Rio Negro ou é concebível associá-la ao aquecimento global?
Marcos Freitas – Quando estudei a seca de 2010, mapeei o aquecimento do Oceano Atlântico e do Oceano Pacífico e também estudei os ajustes no uso da terra devido ao desmatamento. Naquele ano, as águas do Atlântico experimentaram um aumento de temperatura média mais acentuado. Mas a diferença de temperatura máxima foi de 1 a 1,5 graus, talvez com um salto de 2 graus. Este ano temos um pico de quatro graus no Oceano Atlântico, no Hemisfério Norte. O El Niño causou um aumento de 2 graus no Oceano Pacífico, e ainda não é o pico, que será mais próximo de dezembro. O que praticamos é que o clima na região do Rio Negro é fortemente influenciado por massas de ar vindas do Oceano Atlântico. Portanto, é concebível correlacionar essa seca com as mudanças climáticas. Estamos vendo uma recuperação muito forte no Oceano Atlântico.
Agência Brasil – Sem chuva, os incêndios florestais podem aumentar?
Marcos Freitas – A temporada de incêndios tende a se alongar, com bolhas de calor no Pacífico e no Atlântico impedindo a entrada de umidade. Essas bolhas de calor geram forte evaporação e fazem com que a chuva caia mais nos oceanos e menos no continente. Por exemplo, alimenta uma temporada de furacões que atinge as costas dos Estados Unidos. Há alguma compensação com chuvas a montante do Peru, causadas pelo El Niño, que podem ter repercussões na bacia do rio Madeira. Mas grande parte da chuva que cai na Amazônia vem do Atlântico. Massas de ar vindas do Atlântico são bloqueadas através da Cordilheira dos Andes, causando chuvas sobre a Amazônia. Sem essas chuvas, a Amazônia terá um efeito muito negativo, principalmente no componente mais próximo do Rio Negro. Os efeitos do El Niño são mais sentidos no Peru, Bolívia e suas fronteiras com o Brasil.
Agência Brasil – Podemos dizer que os incêndios florestais influenciam o clima?
Marcos Freitas – Sim, é uma via de mão dupla. O clima mais seco favorece o desmatamento. E o desmatamento também promove esse clima mais seco. À medida que o verão amazônico se aproxima, as chuvas começam a diminuir. Isso acontece a partir do mês de maio. E o pico é agosto, setembro. Estes são os meses mais secos. E é nesse momento que o desmatamento aumenta. Se a era seca for mais longa, a Amazônia fica mais vulnerável a incêndios. Com a falta de chuva, a madeira das árvores perde umidade. Além disso, a chuva na Amazônia também é o resultado. de evapotranspiração vegetal. Árvores, principalmente. A destruição dessas usinas pelos incêndios tem o efeito de reduzir as chuvas.
Agência Brasil – Já existem estudos e modelos climáticos que simulam os efeitos que o aquecimento global pode causar, principalmente na Amazônia?
Marcos Freitas – Há algum tempo, vários modelos vêm contemplando o celular amazonense. No início havia muita incerteza e agora há mais precisão. Se conseguirmos diminuir particularmente nossa taxa de desmatamento e inspirar o retorno das plantas à área desmatada, podemos ter um efeito adaptativo positivo, recuperando um pouco de umidade. Se a taxa continuar subindo, teremos ações contínuas para diminuir a umidade. Então, do ponto de vista dos outros, temos que separar quem está nas grandes cidades dos que estão em áreas remotas. Muitas comunidades ribeirinhas, por exemplo, não têm energia elétrica esgotada. Há turbinas que precisam de combustível. Com os rios secando e o transporte inoperante, pode simplesmente haver escassez de combustível. E sem energia elétrica, a conservação dos alimentos é afetada, assim como a qualidade de vida das comunidades. Portanto, precauções devem ser tomadas para aumentar o isolamento: apoiar o uso de energia renovável em ambientes fechados, incentivar a conservação de alimentos e outras medidas que permitirão que outras pessoas passem por esses momentos mais difíceis.
Portal Gazeta do Amazonas (Reprodução autorizada por citação do Portal Gazeta do Amazonas)
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