Ibaneis Rocha, uma ausência previsível desde 8 de janeiro – Capítulo 6

Jornalista e Mestre em Comunicação pela UFJF. Atuou em mídias primárias, tais como: O Globo; Revista do Brasil; Ver; Ex-assessor da presidência do BNDES, pesquisador da Comissão Nacional da Verdade e da CEV-Rio, de “Propaganda e Cinema a Serviço do Golpe de Estado – 1962/1964”, “Imaculada” e “Claudio Guerra: Matar y Arder”.

É possível que amanhã (08/01), quando os cerca de 500 visitantes da Celebração da Democracia, intitulada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “Democracia Inquebrável”, façam fila para a inauguração do evento, ao som do Hino Nacional, os esperados sinalizem a ausência de 8 governadores. Um deles, Ibaneis Rocha (MDB), do Distrito Federal, é o cenário do evento.

Ao contrário do dia 9 de janeiro de 2023, quando acorreram a Brasília 27 governadores, de regiões de Norte a Sul do País, e ainda pisando em cacos de vidro atravessaram a Praça dos Três Poderes ao lado de Lula, para demonstrar apreço a ela, a democracia, nesse 8 de janeiro as diferenças políticas estão sendo colocadas acima desta convicção. Já não se sentem no dever de deixar claro que é preciso respeitar a Constituição e o Estado de Direito, independente das colorações partidárias. 

Por enquanto, como sabemos, não estarão presentes: Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo; Ibaneis Rocha (MDB), governador do Distrito Federal; Gladson Cameli (PP), governador do Acre; Paulo Dantas (MDB), governador de Alagoas; Ronaldo Caiado (União Brasil), governador de Goiás; Mauro Mendes (União Brasil), governador de Mato Grosso; Eduardo Riedel (PSDB), governador de Mato Grosso do Sul e Ratinho Jr (PSD), governador do Paraná. O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, está em dúvida.

Os motivos alegados para faltar à cerimônia são os mais variados, mas no fundo a razão é uma só: os olhos de todos estão postados nas eleições municipais deste ano e nas consequências de cada escolha que façam, para os candidatos ao cargo de prefeito, dos seus partidos. Afinal, ao virar o ano foi dada a largada pela caça aos eleitores. Desses, apenas o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, tem a razão de sua ausência explicitada. Nessa semana, o presidente Lula, em uma entrevista ao jornal O Globo, disse desconfiar que ele (Ibaneis), Bolsonaro e a Polícia Militar do DF (que responde ao governador), estavam no “pacto” golpista para tirá-lo do poder. Oficialmente, o governador disse que não irá porque está fora do país, em férias.

Portanto, concordamos que, no entanto, a ausência de Ibaneis Rocha é muito mais do que o que ele transmitiu à mídia por meio de seus assessores. Na verdade, o governador da Cidade do México é suspeito de ter, para dizer o mínimo, ignorado aquela tarde de horror. .

A desconfiança é justificada. Ibaneis foi escolhido tendo o ex-presidente Jair Bolsonaro como padrinho. Assim que assumiu o cargo, embora soubesse que estava desafiando o novo ministro da Justiça (Flávio Dino) e já tivesse alertado para as desvantagens de nomear seu antecessor, Anderson Torres, como secretário de Segurança do Distrito Federal, ele hizo. de mesmo assim.

Anderson Torres, um dos primeiros funcionários a ser demitido após o conflito de 8 de janeiro. A demissão de Torres foi assinada por meio de Ibaneis Rocha na madrugada de domingo para segunda-feira. O ministro do Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, determinou então a exoneração do governador por 90 dias. Sua vice, Celina Leão (PP), também apoiadora do bolsonarismo, tomou posse.

Um golpe foi descoberto na casa do ex-ministro Anderson Torres – pronto sob a direção da direita para julgar Ives Gandra – além de se comportar com leniência. Ele deveria tirar férias na segunda-feira, 9, mas foi na sexta-feira (06/01) ao mesmo condomínio em Orlando (EUA) onde o ex-presidente estava foragido.

Torres nomeou para o cargo o delegado Fernando Sousa Oliveira, a quem não deu orientação no “Plano Blindagem”, desenhado uma semana antes pelos órgãos de segurança, Ministério da Justiça, Gabinete de Segurança Institucional e governador Ibaneis-Rocha, prevendo ataques. em prédios públicos.

Durante os atos terroristas da tarde de domingo, o governador Ibaneis foi alvo de 37 ligações para seu celular – segundo relatório da Polícia Federal – e, embora estivesse ciente dos perigos da agitação social, foi advertido na semana passada a se acalmar para tirar sua soneca de domingo sem se conectar ao dispositivo que tocou insistentemente.

Uma das questões básicas do plano de segurança dos quadros seria o isolamento da Praça dos Três Poderes, à qual os golpistas não teriam acesso. A praça permaneceu fechada nos dias anteriores ao golpe, mas, inexplicavelmente, no dia anterior, Ibaneis Rocha teria dado ordem para abri-la. Como se não bastasse, a horda de terroristas marchou cerca de 8 quilômetros da Praça dos Cristais até a Praça dos Três Poderes, escoltada pela Polícia Militar do governador. Por mensagem, informou através de Fernando Oliveira, mas com o bónus adicional de que está tudo sob controlo.

Até mesmo a vice-procuradora, Lindôra Araújo (amiga de Flávio Bolsonaro), ao ser procurada para comentar a atuação de Ibaneis, apontou: “embora tivesse ciência da ameaça iminente e tivesse o dever de tomar providências para evitar as ocasiões do dia 8 [. . . ], às vésperas dos fatos, em 7 de janeiro de 2023, havia iniciado manifestações na Esplanada dos Ministérios”. E acrescentou: “há sintomas de atividade criminosa” por parte de Ibaneis, Anderson, Fernando e Fábio.

A “ação criminosa” do governador Ibaneis pode ser descrita nas primeiras linhas em que se refere o relatório final da CPMI (3. 6. 25 – Ibaneis Rocha, p. 872). Na tarde do dia 7 de janeiro, a Secretaria da Polícia Legislativa do Senado Federal (SPOL) tomou conhecimento de uma movimentação de outras pessoas em frente ao órgão, na rodovia N2, em situação semelhante a uma ação de reconhecimento. A SPOL, ao observar a movimentação, alertou o presidente do Senado Federal, senador Rodrigo Pacheco. “

O cenário descrito corresponde aos dados contidos em reportagem da Revista Piauí, de 6 de junho de 2023, que trata do papel das “crianças negras” nos atos golpistas. De acordo com o texto, oficiais formados no Batalhão de Forças Especiais, fundado em Goiânia, recebem esse apelido por usarem uniformes de caixa preta. Conta-se que eles foram até a praça para deixar um carregamento de granadas GL-30, os “dançarinos”, (para uso exclusivo das forças especiais) no gramado. para ser usado na invasão do dia seguinte. Por isso, era vital liberar a Praça dos Três Poderes, para que pudessem ter acesso a ela durante a invasão. E só quem sabia era quem tinha ordens para tornar o espaço transparente.

Esse tipo de aparelho foi descoberto durante vandalismo no prédio do Senado, segundo reportagem do Piauí. “Lá, os golpistas jogaram uma granada do tipo GL-30, apelidada de ‘ballerina’ porque ela quica do chão disparando gás lacrimogêneo, impedindo que o alvo a capture e devolva o dispositivo. “O estranho é que as polícias do Senado e da Câmara não têm esse tipo de granada. Então ele veio aqui de fora”, disse o policial do Senado à revista. Os sites da Câmara e do Senado não mostram compras desse tipo de granada. A outra força de segurança que participou da contenção dos bolsonaristas, a Polícia Militar do Distrito Federal, também não usa esse aparelho, segundo um oficial entrevistado. “O Exército, por outro lado, usa o GL-30 em larga escala para treinamento militar e agrega cursos para crianças negras”, revelou.

Dois generais e nenhuma ação.

É sabido que a segurança do Palácio do Planalto é dever do Exército, isso é realizado por meio de dois órgãos: o Comando Militar do Planalto e a Secretaria de Segurança Institucional. No dia 8 de janeiro, a CMP ficou sob o comando do general Gustavo Henrique. Dutra de Menezes, conhecido bolsonarista. Já o GSI era comandado pelo general Marco Edson Gonçalves Dias, conhecido como GDias, agente de segurança de Lula durante seus dois primeiros mandatos. Por pura coincidência, ambos são crianças negras. O general G. Dias foi forçado a renunciar ao cargo depois que fotos vazaram para a CNN Brasil mostrando sua inação diante de invasores palacianos. Já o general Dutra de Menezes foi demitido do comando do Exército no Planalto em fevereiro e exonerado. desde o seu cargo em abril.

Investigações da Polícia Federal apontam que a ação dos jovens negros não se limitou ao dia 8 de janeiro. Nos dias que se seguiram, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) registrou uma série de sabotagens em torres de transmissão de energia elétrica em todo o Brasil. Como já discutido no Capítulo 3 desta série, os empresários do agronegócio, que financiaram o golpe, também financiaram (segundo o relatório da Abin) movimentos desse tipo. Quatro torres foram demolidas (3 em Rondônia e 1 no Paraná) e 16 destruídas (6 no Paraná, 3 em São Paulo, 6 em Rondônia, 1 em Mato Grosso). Os investigadores atribuem o possível envolvimento de forças especiais em movimentos contrários às instalações de infraestrutura ao fato de elas fazerem parte de seu treinamento.

O relatório da CPMI mapeou em detalhes o comportamento do governador Ibaneis Rocha durante os atos golpistas. “De posse das informações repassadas pela SPOL, o presidente do Senado entrou em contato com o governador Ibaneis Rocha, transmitindo a apreensão da polícia legislativa quanto à possibilidade de ocorrência de atos antidemocráticos, especialmente contra o Senado Federal. Ibaneis, no entanto, garantiu que não ‘teríamos’ problemas e que colocaria “todas as forças nas ruas”, descreve o documento. 

“Portanto, Ibaneis Rocha tinha plena consciência da ameaça de violência. No entanto, como todos sabem, no dia 8 de janeiro o número de forças de segurança foi reduzido, especialmente diante dos alertas de violência”.

E continua: “Também na mesma tarde do dia 7, Ibaneis Rocha autorizou, contrariando o disposto no IAP nº 02, de 2023, a realização de manifestações na Esplanada dos Ministérios, mantendo “tranquilidade e segurança”. Apenas o trânsito de veículos foi proibido, assim, embora o IAP não tenha proibido expressamente o trânsito de pedestres na área da Esplanada de Ministérios, a conduta prudente esperada do Governador foi cumprir o disposto no Plano, abstendo-se de incitar outras pessoas a circularem. escala no local.

Segundo o relatório, “o cenário é alterado pela ausência formal do secretário de Segurança no fim de semana de 8 de janeiro. Como explicado acima, Anderson Torres havia viajado para os Estados Unidos da América, em antecipação às suas férias, que só começariam oficialmente na segunda-feira, 9 de janeiro.

Em que pese Fernando de Souza Oliveira, o secretário-executivo da pasta da Segurança Pública do DF, estar presente no Distrito Federal, seu nome sequer havia sido publicado no DODF, de modo que era apenas um “funcionário de fato” na Administração Pública do GDF. Conforme seu próprio depoimento no âmbito da CPI da CLDF, Fernando de Souza disse que não foi apresentado formalmente sequer ao governador, muito menos aos comandantes das forças de modo oficial. Sua nomeação oficial sairia somente no dia 9 de janeiro, início das férias formais de Anderson Torres. 

Vale lembrar que a subsecretária de Inteligência na pasta de Segurança Pública do Distrito Federal era Marília Ferreira de Alencar, autoridade muito próxima de Anderson Torres, acusada em artigo anterior.

No dia 7 de janeiro de 2023, às 18h23, o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Augusto Passos Rodrigues, informou ao ministro da Justiça, Flávio Dino, que as caravanas seguiam em direção a Brasília e que os integrantes demonstraram “um objetivo transparente de enfrentar as forças de segurança da capital da República”.

No mesmo ofício, Andrei Passos sugere que “grupos de pessoas com o propósito de atentar contra o patrimônio público ou privado, bem como à democracia brasileira, também sejam impedidos de circular nesta capital”. 

Por volta das 19h11, Flávio Dino, por meio da Portaria nº 272 de 2023, legalizou o uso da Força Nacional de Segurança Pública, na Esplanada dos Ministérios, até segunda-feira, 9, “para assistência à população”. que teria o pedido real de Ibaneis Rocha para se concretizar, tendo em vista o respeito obrigatório aos poderes federativos”, diz o relatório.

“No mesmo dia (7 de janeiro), às 19h58, o ministro da Justiça Flávio Dino encaminha um ofício ao governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, com anexo contendo o Ofício nº 5/2023/GAB/PF retrocitado. 

No entanto, em 8 de janeiro, Ibaneis Rocha, mesmo sendo o dono de todas essas informações, acrescentando a do ministro da Justiça e do presidente do Congresso Nacional, não solicitou a tempo o uso da Força Nacional, que, se ativada ao longo do tempo e com um comando coordenado com as demais forças de segurança, seria o uso da Força Nacional. Se ativado ao longo do tempo e com um comando coordenado com as demais forças de segurança, isso só pode ajudar a envolver os golpistas.

De fato, no Ofício nº 1. 735 de 2023, enviado a esta CPMI, o ministro da Justiça, Flávio Dino, informou que a anuência do governador para as movimentações da Força só foi dada às 17h29. Em 8 de janeiro, ou seja, quando os insurgentes já haviam invadido e vandalizado as sedes dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Após o reconhecimento da omissão de Ibaneis Rocha, o ministro da Justiça Federal, Alexandre de Moraes, determinou sua exoneração de suas funções no dia 8 de janeiro, a pedido do Ministério Público Federal no âmbito da investigação 4. 879/DF.

A senadora e relatora da Comissão, Eliziane Gama (PSD-Maranhão), conclui o capítulo referente ao governador Ibaneis Rocha, esclarecendo: “Contudo, em razão de esta Comissão não possuir competência constitucional para investigar governadores de Estados-membros, apontamos a necessidade de aprofundamento das investigações pelas autoridades competentes”. Ou seja, a situação do governador encontra-se apenas adiada. Nada garante que ele não venha a responder, ainda, pela sua omissão ou conivência.

Depois de percorrer os principais eventos que desembocaram no 8 de janeiro, ao longo da semana que se encerra, fica a expectativa dos desdobramentos e das providências a serem tomadas com relação aos principais personagens. São 61 pessoas apontadas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) em seu brilhante trabalho, já são 30 os condenados pela invasão dos Três Poderes da República, mas o que a sociedade espera é que os mandantes, financiadores graúdos e os oficiais militares que mantiveram os acampamentos e influíram de alguma forma para aquele desfecho, também sejam alcançados pela Lei. Comprovados os seus envolvimentos, que todos sejam nivelados pelo que está previsto em nossos Códigos e na Constituição soberana de 1988. “Sem anistia!  Clamam os que se importam com a democracia.

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