Bolsonaro também comentou sobre a operação de busca e apreensão nos endereços ligados ao filho Carlos
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a atacar a Justiça Eleitoral do país neste sábado (3). Em entrevista ao influenciador Sérgio Tavares, Bolsonaro chegou a dizer que o Supremo Tribunal Federal (STF) trabalhou com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em “um controle para eleger Lula a todo custo”.
“Ninguém sabe como Lula da Silva ganhou a eleição”, disse Bolsonaro sobre a eleição de 2022.
Além de insinuar fraude no conflito eleitoral, o ex-presidente insistiu na teoria da conspiração, não comprovada por uma investigação, segundo a qual houve “infiltrados” no ataque contra os Três Poderes em 8 de janeiro de 2023 e uma vez após informações incorretas sobre a covid. 19, reiterando suas posições passadas a favor do “tratamento precoce” e seu ceticismo em relação às vacinas que apoiam a doença.
Bolsonaro também se referiu à operação de busca e apreensão de residências relacionadas a Carlos Bolsonaro (Republicanos), vereador do Rio de Janeiro. O filho do ex-presidente é investigado pela Polícia Federal (PF), suspeito de rastrear inimigos políticos por meio de um aparato paralelo de dados instalado dentro da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
“São declarações muito perturbadoras no sentido de desinformação”, diz Daniel Pinheiro, professor universitário e pesquisador em cultura política da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).
Para Pinheiro, o fato de ter feito essas declarações a uma mídia estrangeira, como o canal da influenciadora portuguesa, não configura conduta para que as acusações fujam da Justiça brasileira.
“Qualquer declaração de uma pessoa pública, independentemente do veículo em que esteja e sobretudo um ex-presidente da República, terá um impacto político. Com certeza irá ecoar no Brasil. Hoje em dia, a informação não tem fronteiras, vai chegar no País e vai repercutir. No âmbito jurídico, com certeza vai ser debatido, sobretudo no rol das ações que tramitam nessa temática”, explica Pinheiro.
Sobre urnas eletrônicas, ex-presidente foi evasivo
Questionado pelo influenciador sobre o uso das urnas eletrônicas nas últimas eleições do País, Bolsonaro deu uma resposta evasiva e se queixou de não poder “duvidar” do sistema eleitoral. “Quem duvidar das eleições do Brasil em 2022 será preso. Preciso falar mais alguma coisa?”, questionou o ex-presidente, evitando uma crítica mais direta ao processo de voto digital.
A insistência em uma suposta tese de falibilidade no voto eletrônico levou Bolsonaro a ser declarado inelegível pelo TSE. Em 18 de julho de 2022, o então presidente convocou uma assembleia com embaixadores estrangeiros na tentativa de semear suspeitas sobre o sistema eleitoral do país.
O episódio foi denunciado por partidos de oposição à época e, em junho de 2023, o ex-presidente teve sua inelegibilidade decretada no TSE por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
Desde a implantação do dispositivo de votação eletrônica no Brasil, em 1996, nunca houve fraudes relacionadas a esse sistema.
Para Daniel Pinheiro, o caráter questionável da reação é estratégico para a comunicação do ex-presidente.
“Ele quer manter os discursos que produz. Manter o discurso é manter a força. Mesmo que seja uma tese enfraquecida que já lhe causou danos jurídicos, não podemos esquecer que ele também está lutando contra essa condenação. “Então é um reforço, porque ressoa e transmite a mensagem para seus seguidores”, diz a pesquisadora.
Enquanto presidente, Bolsonaro chegou a patrocinar uma iniciativa parlamentar pelo voto impresso, mas a proposta acabou rejeitada pela Câmara dos Deputados. Mesmo derrotada no Legislativo, Bolsonaro continuou a retomar a ideia em discursos inflamados.
Além das insinuações de fraude que nunca foram comprovadas, houve ataques à Justiça Eleitoral, posição que ratificou na entrevista deste sábado, alegando que o TSE, em conluio com o Supremo Tribunal Federal (STF), fez “um controle para eleger Lula a todo custo”.
Insatisfeitos com os efeitos eleitorais e encorajados pela retórica insinuante contra o sistema eleitoral, os apoiadores do ex-presidente acamparam ao ar livre em quartéis militares por todo o país durante semanas, desde o final das eleições até os primeiros dias do governo Lula.
A paciência desses campos se esgotou no dia 8 de janeiro, quando milhares de golpistas vandalizaram a sede dos Três Poderes, em Brasília. Como o Estadão demonstrou ao analisar mais de 30 horas de vídeo, os golpistas reproduziram em seu ato extremista o conteúdo dos discursos de Bolsonaro no PL, piso 0 de sua campanha à reeleição.
Bolsonaro fala em ‘armadilha’ no 8 de Janeiro
Na entrevista ao influenciador português, Bolsonaro afirmou que “há uma pegadinha” no dia 8 de janeiro. “Eu chamo de Capitólio do Tupiniquim”, disse o ex-presidente, em alusão ao ataque ao Congresso dos EUA em 6 de janeiro de 2021. quando, em casos semelhantes ao brasileiro, apoiadores do então presidente Donald Trump – e incentivados por meio dele – invadiram a sede do Legislativo americano, no dia em que os parlamentares se preparavam para ratificar a vitória de Joe Biden nas eleições americanas.
Citando o ataque ao Capitólio, Bolsonaro sugeriu que ambos os ataques foram “armadilhas” armadas por inimigos políticos. “Houve invasões e depredações de prédios públicos. Porém, quando esses brasileiros chegaram lá, tudo já estava vandalizado”, disse Bolsonaro. em desacordo com os fatos apurados através das investigações realizadas através do STF e da CPI no Congresso Nacional e no Parlamento. Assembleia Legislativa do Distrito Federal.
Segundo a investigação, os prédios só foram vandalizados às 15h, quando, após romperem cordões policiais na Praça Três Poderes, os extremistas começaram a atacar o espaço público.
Bolsonaro buscou insinuar que a linha de frente dos vândalos foi ocupada por meio de “infiltrados”, narrativa que seus apoiadores usam desde o dia dos golpes.
O acesso à Wikipédia de 8 de janeiro foi sucessivamente editado para inserir no artigo uma edição que não corresponde aos fatos demonstrados na investigação. Apoiadores do ex-presidente ainda afirmam, em diversos fatos, que o dever dos ataques era falso.
O ex-presidente volta a falar sobre tratamentos ineficazes
Durante a pandemia da Covid-19, Bolsonaro incentivou a adoção do “tratamento precoce”, protocolo da Covid-19 que se referia à ivermectina e a medicamentos sem eficácia comprovada contra a doença, como a cloroquina.
Na entrevista, o ex-presidente voltou a defender os medicamentos, alegando, sem apresentar provas, que a ivermectina, receitada em presídios do País, teria impedido os detentos de adoecerem de covid-19.
“Durante a pandemia, tentei examinar o máximo possível o que estava acontecendo. Cheguei a uma conclusão aparente: seja qual for o medicamento ou o procedimento, a decisão é dos médicos”, disse o ex-presidente.
No entanto, com a crise da Covid-19, o então líder do Executivo entrou em conflito direto com seus ministros, que buscaram manter protocolos contra o vírus identificados como eficazes pela comunidade médica.
Segundo especialistas ouvidos por meio da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a Covid, mesmo em 2021, o país poderia ter evitado até 400 mil mortes pela doença se tivesse seguido as medidas adequadas contra a disseminação do novo coronavírus. .
‘Não tomei pois li a bula’, diz Bolsonaro sobre vacina da covid
Além de insistir em métodos ineficazes contra a covid-19, Bolsonaro voltou a ratificar um ceticismo em relação às vacinas, o único método comprovado para prevenção de casos graves e óbitos. “Não tomei pois não foi concluída a última fase (dos testes), e li a bula (do imunizante) da Pfizer”, disse Bolsonaro ao influenciador português.
Ao contrário do que se afirma, a vacina da Pfizer passou pela última fase de testes clínicos e recebeu registros definitivos de órgãos de vigilância sanitária de todo o mundo, acrescentou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Em novembro do ano passado, a vacina contra a Covid-19 foi incluída na lista de vacinas obrigatórias para crianças pequenas com 6 meses ou mais. Questionado pelo entrevistador sobre o tema, Bolsonaro foi evasivo.
“Se eu desistir do meu cargo, posso ser preso no Brasil. Na minha opinião, a decisão cabe aos pais”, disse o ex-presidente.
Infectologistas foram entrevistados e esclareceram que a vacinação obrigatória contra a Covid-19 no calendário infantil se deve às evidências clínicas que mostram que a doença está se tornando mais prevalente em crianças pequenas. Além disso, condicionar o acesso público à comprovação de estar em dia com o calendário de vacinação não é novidade no país e é prática padrão para uma série de vacinas.
Bolsonaro comenta inquéritos da PF
Sobre vacinas, Bolsonaro afirmou, ainda, que havia sido inocentado em um inquérito da PF que investiga uma adulteração em seu cartão de imunização, distorcendo a conclusão a que chegou a Controladoria-Geral da União (CGU) em 19 de janeiro.
A CGU mostrou que os registros de vacinação no cartão de Bolsonaro atribuído a uma UBS na capital São Paulo são falsos. Isso não prova a “inocência” de Bolsonaro, já que uma investigação sobre seu registro de vacinação está em andamento.
A investigação está sendo realizada por meio da Polícia Federal e apura supostas irregularidades nos registros de vacinação, supostamente realizadas em Duque de Caxias (RJ). É o caso que acusa o ex-presidente de crimes, nos quais já foi alvo de buscas e apreensões.
Ainda em relação à PF, Bolsonaro reclamou da política midiática da operação de busca e apreensão que teve como alvo os endereços de seu filho, Carlos Bolsonaro, bem como da investigação que investiga suspeitas de uso indevido do formato da Abin para espionar adversários políticos da família. .
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