Disparidade = desigualdade, diferença. Não há outra palavra para descrever o que há no Acre e em Roraima. Como a população sofre uma das maiores enchentes do Acre, Roraima, o desafio é a estiagem. Mas quais são as razões para esses outros fenômenos na mesma região?
A equipe do Portal Amazônia conversou com Anderson Mesquita, professor de Geografia Quantitativa e Geografia de Risco da Universidade Federal do Acre (Ufac), que destacou os principais pontos que causam outros fenômenos climáticos nessa proximidade.
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Segundo a Defesa Civil do Acre, no dia 29 de fevereiro deste ano, a vazão do Rio Acre chegou a 16,82 metros e provocou o deslocamento de mais de 20 mil pessoas na área. Os dados confirmam uma enchente histórica. A capital, Rio Branco, e municípios do interior são afetados pelas águas emergentes e o governo federal identificou estado de emergência em 25 de fevereiro.
À medida que as águas transbordam os rios do Acre, elas desaparecem dos rios de Roraima. No início deste ano, a estação chuvosa está mais curta do que o esperado, o que também reflete o fenômeno El Niño.
Com rachaduras e solos áridos, o Lago dos Americanos, no Parque Anauá, em Boa Vista (RR), está absolutamente seco. A situação se repete em outras áreas da capital roraima.
No entanto, assim como a água afeta a vida de milhares de pessoas no Acre, o incêndio representa um risco para a população de Roraima. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a situação dos focos de calor que podem causar incêndios é a maior já registrada no estado nos últimos 25 anos. O estado ocupa uma área de pouco mais de 200 mil km² e é o menos populoso do país. No entanto, desde o início do ano representam 30% de todos os incêndios registados. No Brasil, segundo o INPE. São 2. 600 pelotões de fuzilamento.
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Anderson Mesquita explica como é concebível que os cenários de seca e enchente enfrentados pelos estados da região Norte possam ocorrer ao mesmo tempo.
“O bioma amazônico é dividido em 4 regimes climáticos. Isso significa que na região temos 4 núcleos de precipitação e distribuição de temperatura, mas basicamente em precipitação. Ou seja, embora eu tenha um domínio da Amazônia com uma época de chuvas mais intensas, não significa que isso também vai ocorrer. “
O professor ressalta que no Acre as chuvas tendem a se acumular entre dezembro e março e que, em comparação com outras regiões do Norte, como Roraima ou Amapá, a distribuição das chuvas é diferente, o que ocorre nos demais meses.
“No Acre existe um fenômeno, o frio. Acontece de maio a setembro, mas o mesmo não acontece em Roraima”, diz.
Mesquita explica que o frio é produzido através da massa de ar polar, formada na Antártida, que se desloca para o sul da Amazônia, reduzindo a temperatura. Dependendo da força da massa de ar, os termômetros do Acre podem ler entre 14 e 15 graus. “Esse fenômeno não ocorre em muitos estados amazônicos, ou seja, estamos falando da mesma abrangência territorial”, diz.
Segundo Mesquita, graças aos dados meteorológicos, é possível verificar que a Amazônia não tem um clima único. O clima não pode ser o mesmo, mas por que dois estados têm situações tão extremas?Como pode estar seco em Roraima, ao mesmo tempo em que há uma cheia dos rios no Acre, no extremo sul da Amazônia?
Ele diz que há uma faixa de baixa tensão conhecida como “Zona de Convergência Intertropical” que permeia toda a região próxima ao equador. É um domínio muito nublado, ou seja, um domínio que recebe uma grande quantidade de radiação solar.
“Esse domínio total onde o oceano está evapora e se transforma em nuvens. E, obviamente, essas nuvens geram precipitação. Eu diria que esse é o primeiro efeito que motiva essas chuvas intensas no Acre”.
“É simples assim”, diz o pesquisador. Segundo Mesquita, existe uma fórmula chamada Alta Subtropical do Atlântico Norte (ASAN), que é um domínio de alta tensão no Hemisfério Norte.
“De uma forma muito rudimentar, o que é que esta cimeira faz? Ele empurra toda essa umidade para o Acre, ou seja, deixa de fornecer essa umidade para Roraima, por isso chove menos”, revelou.
Segundo o professor, a partir de março, as estações do ano são substituídas e o inverno chega ao hemisfério norte. Entre os meses de abril, maio, junho e julho, essas estações se invertem. A fórmula anticiclônica enfraquece e toda a umidade que entra no Acre é direcionada para Roraima, portanto, a tendência de chuva é maior neste período.
“Além desse ciclo fitoterápico, existe um outro fator, que são as mudanças climáticas. E também El Niño e La Niña, que são fenômenos que acabam afetando muito a dinâmica climática da Amazônia. Sempre que há um El Niño, “a região acaba passando por um momento de seca, o ano passado foi um exemplo da força desse fenômeno, pois afetou todos os estados”.