A resolução da Justiça de Mato Grosso para cancelar a criação de um parque pode agravar a crise climática, alerta carta publicada na “Science”

De acordo com o texto, o estado de Mato Grosso está fortemente ameaçado por movimentos do agronegócio que priorizam o lucro em detrimento da proteção ambiental.

Considerado um dos maiores santuários ecológicos da Amazônia, o Parque Nacional Cristalino II, no norte do Mato Grosso, corre o risco de desaparecer caso o governo estadual recorra da recente decisão do Tribunal de Justiça do Estado (TJMT). ) para cancelar a criação do parque. Em uma carta publicada na revista Science em 25 de julho, especialistas alertam que a resolução abre um precedente prejudicial para o cancelamento de outros parques nacionais e pode piorar ainda mais a crise climática.

De acordo com o texto, assinado por pesquisadores do Instituto Centro de Vida (ICV), do Observatório Socioambiental de Mato Grosso, da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. (Inpa), o estado do Mato Grosso está fortemente ameaçado pelos movimentos do agronegócio que priorizam o lucro em detrimento da proteção ambiental.

A ação de cancelamento do Parque Nacional Cristalino II tramita na Justiça estadual desde 2011 e é movida por meio de pessoa jurídica que contesta o procedimento formal de consulta pública para a criação da unidade, alegando ser proprietária de residências no local. O caso foi julgado favorável à empresa em abril de 2023. Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), a empresa possui títulos fraudulentos, supostamente emitidos por meio do Instituto Fundiário do Mato Grosso (Intermat), órgão estadual de terras.

O Parque Nacional Cristalino II foi criado pelo governo local em 30 de maio de 2001. A área, localizada a cerca de 800 quilômetros da capital Cuiabá, abrange 118. 000 hectares e é rica em fauna e flora típicas da região, lar de árvores e espécies amazônicas em perigo de extinção. animais, como o macaco-aranha. De acordo com a carta, o parque também desempenha um papel na luta contra o desmatamento no sudeste da Amazônia.

Mato Grosso lidera o desmatamento entre os estados da Amazônia Legal em 2024, segundo o Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). O Estado detém também recordes em termos de produção agroalimentar nacional, sendo responsável, apenas este ano. , para 18,9% das exportações do setor, segundo dados do Ministério da Agricultura e Pecuária. Diante desses dados, as entidades alertam para a necessidade premente de medidas de cobertura ambiental para a região.

Para um dos autores do artigo, Philip Fearnside, do INPA, a resolução de cancelar a criação do parque nacional beneficia uma empresa acusada de grilagem de terras, considerada um dos principais vetores do desmatamento. um único juiz pode provocar resoluções semelhantes, ameaçando não só o bioma amazônico de Mato Grosso, mas também outros, como o Cerrado, muito cobiçado pelo agronegócio e que tem relativamente poucos espaços em unidades de conservação”.

De acordo com Marcondes Coelho, analista socioambiental do Instituto Centro de Vida (ICV) e principal autor do artigo, a decisão do TJMT é contrária a outras jurisprudências do sistema de justiça brasileiro. “A alegada falta de consulta, aqui contestada, não justifica o desaparecimento dos parques. Ainda mais em um procedimento com provas da legalidade de sua criação e suspeita de fraude por parte do escritor que questiona a vida do espaço”, acrescenta. O analista lembra ainda que essa resolução só pode se tornar um risco para o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o SNUC, criado pela Lei nº. 9. 985 de 18 de julho de 2000.

Lucas Ferrante, pesquisador da USP e da Ufam, também coautor do estudo, ressalta que a Amazônia está em seu ponto de não retorno, em termos de desmatamento tolerado. “Se cruzarmos essa linha, as consequências para o Brasil serão graves. » Ele cita como exemplos o avanço da crise climática, o colapso da agricultura e dos recursos humanos e o surgimento de um ciclo de novas pandemias.

A carta destaca a necessidade urgente de tomar medidas para pôr fim a esta decisão. Especialistas recomendam que governos locais e Ministérios Públicos estaduais recorram ao Superior Tribunal de Justiça, ou mesmo à Justiça Federal. Segundo o Ministério Público estadual, o TJMT pede que o caso seja encaminhado ao Centro Judiciário de 2º Grau de Resolução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) para tentativa de conciliação entre as partes.

*Conteúdo publicado pela Agência Bori

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